sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

FORA AS TROPAS DE OCUPAÇÃO DO HAITI!


Reflexões do companheiro Fidel

HAITI: O SUBDESENVOLVIMENTO E O GENOCÍDIO

Há apenas uns meses, a 26 de julho de 2010, Lucius Walker, líder da organização norte-americana Pastores pela Paz, em um encontro com intelectuais e artistas cubanos, perguntou-me qual seria a solução para os problemas do Haiti.
Sem perder um segundo lhe respondi: “No mundo atual não tem solução, Lucius; no futuro do qual estou falando, sim. Estados Unidos é um grande produtor de alimentos, pode abastecer 2 000 milhões de pessoas, teria capacidade para construir casas que resistam perante os terremotos; o problema é a forma em que os recursos são distribuídos. Ao território do Haiti é preciso restituir-lhe de novo até as florestas; mas não tem solução na ordem atual do mundo.”
Lucius se referia aos problemas desse país montanhoso, super povoado, desprovido de árvores, combustível para cozinhar, comunicações e indústrias, com um elevado analfabetismo, doenças como o VIH, e ocupado pelas tropas das Nações Unidas.
“Quando essas circunstâncias mudem ―acrescentei― vocês próprios, Lucius, poderão levar alimentos dos Estados Unidos para o Haiti.”
O nobre e humanitário líder dos Pastores pela Paz faleceu mês e meio depois, em 7 de setembro, com 80 anos de idade, legando a semente de seu exemplo a muitos norte-americanos.
Ainda não tinha aparecido uma tragédia adicional: a epidemia de cólera, que em 25 de outubro atingiu mais de  3 000 casos. A tão dura calamidade se soma que em 5 de novembro um furacão açoitou seu território, causando inundações e o transbordamento dos rios.
Este conjunto de dramáticas circunstâncias merece que lhe seja dedicada a devida atenção.
A cólera apareceu pela primeira vez na história moderna em 1817, ano em que ocorreu uma das grandes pandemias que açoitaram a humanidade no século XIX, que causou grande mortalidade principalmente na Índia. Em 1826 reincidiu a epidemia, invadindo Europa, incluída Moscou, Berlim e Londres, espalhando-se para nosso hemisfério de 1832 até 1839.
Em 1846 prorrompe uma nova epidemia ainda mais prejudicial, que abalou três continentes: Ásia, África, e América. Ao longo do século, epidemias que afetavam essas três regiões se foram repetindo. Contudo, no decurso de mais de 100 anos, que abrange quase todo o século XX, os países da América Latina e do Caribe ficaram livres desta enfermidade, até 27 de janeiro de 1991, em que apareceu no porto de Chancay, a norte do Peru, que primeiro se estendeu pelas costas do Pacífico e depois pelas costas do Atlântico, atingindo 16 países; 650 mil pessoas adoeceram em um período de 6 anos.
Sem dúvida alguma, a epidemia afeta muito mais os países pobres, em cujas cidades se aglomeram bairros populosos que muitas das vezes carecem de água potável, e as servidas, que são portadoras do víbrio da cólera causadora da doença, misturaram-se com aquelas outras.
No caso especial do Haiti, o sismo desfez as redes de uma e de outra onde elas existiam, e milhões de pessoas moram em casas de campanha que muitas das vezes carecem inclusive de latrinas, e tudo se mistura.
A epidemia que afetou nosso hemisfério em 1991 foi o víbrio da cólera 01, biótipo El Tor, sorotipo Ogawa, exatamente o mesmo que penetrou por Peru naquele ano.
Jon K. Andrus, Diretor Adjunto da Organização Pan-americana da Saúde, informou que a bactéria presente no Haiti era precisamente essa. Disso se deriva uma série de circunstâncias a levar em conta, que no momento oportuno determinarão importantes considerações.
Como se sabe, nosso país vem formando excelentes médicos haitianos e prestando serviços de saúde nesse irmão país já lá vão muitos anos. Existiam problemas muito sérios nesse domínio e se avançava ano após ano. Ninguém podia imaginar, por não existir antecedentes, que ocorresse um sismo que matou mais de 250 mil pessoas e ocasionou inúmeros feridos e lesionados. Face a esse golpe inesperado, nossos médicos internacionalistas envidaram seus esforços e se consagraram a seu trabalho sem descanso.
No meio do duro desastre natural, há apenas um mês se desatou a epidemia de cólera com grande força; e como já expressamos, em tais circunstâncias desfavoráveis apareceu o furacão.
Perante a gravidade da situação, a Sub-secretária Geral das Nações Unidas para Assuntos Humanitários, Valerie Amos, declarou ontem que se necessitavam mais 350 médicos e 2 000 enfermeiras para encarar a doença.
A funcionária fez um apelo para estender a ajuda mais além de Porto Príncipe, e revelou que os fornecimentos de sabão e de água limpa apenas são recebidos pelo 10 por cento das famílias instaladas fora da capital, sem assinalar quantos os recebiam nessa cidade.
Diversos funcionários das Nações Unidas lamentaram nos últimos dias que a resposta da comunidade internacional ao pedido de ajuda feito para enfrentar a situação não chegava a 10% dos 164 milhões de dólares solicitados com urgência.
“Amos reclamou uma reação rápida e urgente para evitar a morte de mais seres humanos por causa da cólera”, informou uma agência de notícias.
Outra agência comunicou hoje que a cifra de haitianos mortos se eleva já a “1 523 pessoas, 66 mil 593 têm sido atendidas, e mais de um milhão de habitantes continuam dormindo nas praças públicas”.
Quase 40% dos doentes foi atendido pelos integrantes da Brigada Médica Cubana, conformada por 965 médicos, enfermeiros e técnicos que conseguiram reduzir o número de mortes a menos de 1 por cada 100. Com esse nível de atendimento o número de baixas não atingiria a cifra de 700. As pessoas falecidas, como norma, estavam extremamente debilitadas pela desnutrição ou causas similares. As crianças detectadas a tempo, apenas falecem.
Resulta de muita importância evitar que a epidemia se espalhe a outros países da América Latina e do Caribe, porque nas atuais circunstâncias causaria um prejuízo extraordinário às nações deste hemisfério.
Impõe-se a necessidade de procurar soluções eficientes e rápidas à luta contra essa epidemia.
Hoje foi adotada a decisão pelo Partido e o Governo de reforçar a Brigada Médica Cubana no Haiti com um contingente da Brigada “Henry Reeve”, integrado por 300 médicos, enfermeiras e técnicos da saúde, que seriam no total mais de 1 200 colaboradores.
Raúl estava visitando outras regiões do país e está informado em pormenor de tudo.
O povo de Cuba, o Partido, e o Governo, mais uma vez estarão à altura de sua gloriosa e heróica história.


Fidel Castro Ruz
26 de novembro de 2010
21h58

Reflexões do companheiro Fidel

NOTÍCIAS DA CÓLERA NO HAITI



Há muitas coisas das quais falar quando os Estados Unidos ficam envolvidos em um escândalo colossal como conseqüência dos documentos publicados por Wikileaks, cuja autenticidade ―independentemente de qualquer outra motivação desse sítio Web― ninguém colocou em dúvida.

Contudo, nosso país neste instante está comprometido em uma batalha contra a cólera no Haiti, que por sua vez se torna em uma ameaça para os outros povos da América Latina e para outros do Terceiro Mundo.

No meio das conseqüências de um terremoto que matou ou feriu mais de meio milhão de pessoas e causou uma enorme destruição, desatou-se a epidemia que, quase de imediato, ficou agravada pelo açoite de um furacão.

O número de pessoas afetadas pela doença se elevava ontem, 
29 de novembro, a 75 mil 888, das quais a Brigada Médica Cubana atendeu 27 mil 015, com 254 falecidos para 0,94%. O resto das instalações hospitalares públicas, ONGs e privados, atenderam 48 mil 875, das quais morreram 1 721, para 3,03%.

Hoje, 30 de novembro, a Missão Médica Cubana, que aliás conta com 201 formados da Escola Latino-americana de Medicina, atendeu 521 pacientes de cólera para totalizar 27 536.

No domingo passado, 28 de novembro, chegaram ao Centro de Tratamento da Cólera do hospital de referência comunitário situado na comuna L’Estere do Departamento Artibonite,  18 pessoas em estado muito crítico, procedentes de uma sub-comuna chamada Plateau, as que foram atendidas imediatamente pelos 11 médicos e 12 enfermeiras da Brigada Médica Cubana que ali trabalha. Afortunadamente, conseguiu-se preservar a vida de todos.

Na segunda-feira 29 chegaram desde a mesma sub-comuna mais 
11 casos, entre eles, uma criança de cinco anos cujos pais tinham falecido por cólera. Mais uma vez se conseguiu preservar a vida dos mesmos.

Perante tal situação, o Dr. Somarriba, chefe da Missão Médica, decidiu o envio de um veículo todo-terreno com 5 médicos, 2 enfermeiras, um enfermeiro e um reabilitador para a sub-comuna, com os recursos necessários para atender os casos com urgência.

Dos cinco médicos, quatro são formados da ELAM: uma uruguaia, um paraguaio, um nicaragüense, um haitiano e o chefe da brigada cubana do departamento de Artibonite.

Percorreram seis quilômetros pela estrada, caminharam mais seis por terrapleno, e finalmente outros dois quilômetros por terreno abrupto com todo o equipamento e os recursos em cima para chegar até a sub-comuna.

Plateau está situada entre cinco montanhas com casas humildes agrupadas em três pontos; calcula-se que o número de habitantes se aproxima de cinco mil.  Não há ruas, nem eletricidade, nem comércios segundo informaram, e apenas uma igreja protestante.

A população, de pobreza extrema, dedica-se fundamentalmente ao cultivo de amendoim, milho, feijão e abóbora.

Quando chegaram a Plateau, o pastor da igreja ofereceu-se para organizar dentro da mesma o Centro de Tratamento, com seis catres e quatro bancos dos fiéis, que permite que 10 pessoas sejam internadas de urgência.

Hoje ingressaram oito, três em estado crítico.

Os vizinhos comunicam que já faleceram por volta de 20. Esses dados não aparecem na cifra oficial de falecidos. Durante a noite trabalharão com as lanternas que eles levaram.

A Missão decidiu criar um Centro de Atendimento da Cólera nessa intricada comunidade, que terá 24 leitos. Amanhã serão enviados todos os recursos, incluído o gerador elétrico.

Informa igualmente que os cameramen foram até a comuna ao conhecerem da notícia.

Hoje não houve falecidos e foi aberto outro estabelecimento no norte, para um total de 38 centros e unidades de tratamento da cólera.

Relato o caso para explicar as circunstâncias e os métodos com os que ali se leva a cabo a luta contra a epidemia, que com dezenas de falecidos diariamente vai se aproximando das 2 000 vítimas mortais.

Com os métodos de trabalho que estão sendo aplicados e o esforço programado, será mais difícil que o número de falecidos continue ao ritmo que tinha.

Conhecendo as paixões com que os processos eleitorais tradicionais se desenvolvem, para além do abstencionismo típico que caracteriza muitos deles, preocupava-nos o que poderia acontecer no Haiti no meio da destruição e da epidemia. Um princípio básico e jamais violado é o respeito às leis, aos partidos e às crenças religiosas dos países onde prestam seus serviços nossos médicos ou a Brigada “Henry Reeve”.

Todavia, inquietaram-nos as versões amplamente divulgadas pelos meios internacionais de imprensa que mostraram um quadro de violência generalizada no país, que estava longe de ser realidade. Os observadores internacionais estavam surpreendidos por aquelas notícias que se divulgavam no exterior, quando na verdade os fatos que deram lugar aos mesmos foram isolados, afetando apenas em uma reduzida percentagem os eleitores que exerceram seu voto.

Os próprios líderes que fizeram um apelo ao povo para sair às ruas compreenderam que não era correto, no meio da trágica situação do país, a realização de ações que podiam incentivar enfrentamentos violentos que impossibilitariam controlar e derrotar a epidemia. Se tal objetivo não se consegue, esta poderia se converter em endêmica e dar lugar a um desastre sanitário no Haiti e a uma ameaça permanente para o Caribe, bem como para a América Latina, onde milhões de pessoas pobres em número crescente se acumulam nas grandes cidades; também para outras muitas nações pobres da Ásia e da África.

Não se deve esquecer nunca que, além disso, o Haiti tem que ser reconstruído desde seus alicerces, com a ajuda e a cooperação de todos. É o que esperamos para seu nobre e abnegado povo.

Fidel Castro Ruz
30 de novembro de 2010
21h34

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